O filtro romântico
” — O Jeff é tão sensível, né?”
Joyce fez este comentário enquanto ainda estávamos conversando. Eu me lembro de não reagir com nada além de um sorriso. Sensibilidade é uma das minhas principais características, e estou num momento de conviver bem com o fato. Ainda vivemos num mundo onde ser sensível ou vulnerável não são virtudes positivas para um homem, ainda que sejam admiradas por algumas pessoas. O meu maior desafio naquele momento não era lidar com as questões em volta do meu comportamento, mas não permitir que o ambiente eletrônico do casamento tirasse a proximidade e o tom de romance que ele precisava ter. O design seria o filtro de onde as pessoas conseguiriam suspirar com a história dos dois, mesmo de pijama, às 7 da manhã.
Neste ponto, eles trouxeram algo extremamente interessante: elementos visuais. Depois de escolher a paleta de cor e os metais que serão aplicados na festa de casamento (metais estes que foram descartados por mim neste trabalho), um casal apresentará seus elementos visuais que vão compor a história da festa, que começa a ser contada no convite. Nada deste caminho tradicional me servia para Jhow e Joy, então eu precisava pensar num novo caminho para contar essa história sem que ela se parecesse um mero evento online, e tampouco com uma festa num buffet. Olho para trás e me pergunto sobre como consegui me manter sereno diante de um desafio assim.
Os elementos visuais escolhidos pelos noivos eram… Emojis. Eles sempre se comunicam com emojis específicos, cheios de significados entre eles. Os jovens são assim, sabem se expressar de acordo com seus contextos em todas as eras. Quando eu era criança, via as amigas da minha tia se comunicando com seus namoradinhos através de bilhetes com letras de músicas do Legião Urbana. Na minha época, as referências eram séries, livros ou até comidas, como no meu próprio caso. Na era da comunicação constante pelos smartphones, nada faria mais sentido: emojis.
E quanto a emojis, quantas possibilidades! Esse alfabeto imagético baseado no alfabeto japonês tem tantos caracteres que cada casal do planeta consegue formar conjuntos para chamar de seus. Jhow e Joy sabiam disso e escolheram seu grupo: o urso marrom. Uma plantinha nascendo, representando o começo de um projeto. Um coração branco. Patinhas de urso. Acrescentei o mar e o emoji do amanhecer. Seis imagens. Por mais que elas estivessem disponíveis em alta definição no meu sistema operacional, fiz o exercício de passar o “filtro romântico” sobre todos os elementos da minha entrega, assim eu poderia ter a versão adequada para o casamento de itens meramente digitais.
Os emojis seriam redesenhados por mim, e coloridos em aquarela. As texturas dariam a ternura e o artesanato necessários para tanta comunicação eletrônica. Os posts receberam molduras, como polaroids, sem necessariamente imitá-las mas trazendo o seu conceito. Me lembro que consegui desenhar e colorir os elementos em “uma sentada”, de tão convicto de que a ideia daria certo.
Ao contornar o emoji de coração, percebi como estava diante de uma forma única e muito especial de coração. Usei o desenho vetorizado para finalizar a marca. Quando me dei conta, o esquema visual estava pronto.
Ao contrário do que eu imaginei que seria, os noivos não me pediram alteração alguma para o conceito e seus itens. Tudo ficou aplicável para não depender de mim ou do photoshop para acontecer, e os posts ganharam uma unidade incrível, da qual o Jhow cuidou com muito carinho. Com o passar dos meses e a piora do cenário pandêmico no Brasil, Jhow e Joy precisaram adiar a realização da cerimônia para um outro momento, o que considerei muito prudente da parte deles.
Algo que este trabalho me trouxe foi exatamente a necessidade de aplicar olhos de amor ao que eu mesmo estava vivendo. Mesmo sem ter perspectivas sobre como a minha vida prosseguiria ou como lidaria com o cancelamento de meus maiores sonhos, eles me ensinaram – em meio a alegria dos jovens casais – o quanto vale a pena aplicar um filtro de romance quando a vida perde a cor. E o resultado pode ser um colorido natural… Um pouco de cor-de-rosa no dia-a-dia da vida a dois.