Crescer
Desde os tempos em que estávamos “embrionando” o Instagram em Festa, uma coisa deixava a Ju muito preocupada e tensa: a hora de se mostrar no mundo real para garantir o sucesso de uma estratégia de marketing digital. Profissionais como ela sempre viverão esse tipo de momento. Seja num evento, um lançamento, uma mostra. No nosso caso, havia um ponto de tensão que sempre voltava para a mesa: as famosas feiras.
As feiras de decoração são os lugares onde as decoradoras se encontram. Pelo que entendi, as melhores delas são contratadas por fornecedores e pela própria organização de uma feira para proporcionar experiências impactantes para os compradores. As feiras, num geral, caíram numa febre que atualmente deixa todo mundo louco: espaços instagramáveis. Lugares feitos para virar post no instagram, com uma linguagem atrativa para o “mundo perfeito” que a rede social propõe. A ideia é fazer algo tão bonito que não seja necessário um bom filtro ou um bom fotógrafo para garantir um bom post. Que cenário bom para lançar a ideia do Instagram em Festa, certo?
Foi aí que o trabalho deixou de ser meramente digital. Até a experiência passada, eu recebia o trabalho artístico pronto e não participava pessoalmente da concepção de novas postagens. Esse novo desafio pedia que eu estivesse presente para as minhas inserções. Em vez de colocar meus rabiscos usando uma mesa digitalizadora, era hora de aprender a mexer nos canetões e eu mesmo “colocar a mão” no que seria o feed de Instagram que eu trabalharia depois, no photoshop.
Meu sonho era que o Instagram da Ju Françozo parecesse uma vitrine, do jeito que ela sonhava. Pensamos em tudo, e as talentosas fotógrafas do Tria Estúdio estavam lá de novo para dar o olhar que eu precisava. Cada aresta das salas instagramáveis se encaixando em quadrados exatos, formando espaços tridimensionais dentro do feed em si. Dando a “liga” entre tudo, montagens reais, objetos que estavam realmente lá e ilusões de ótica com outros itens recortados, mas que foram devidamente fotografados lá, pintados e texturizados por nós. Minha ideia era ter o mínimo de elementos externos possível. Em muitos momentos, não tivemos nenhum. Nada de banco de imagens. Cada elemento que aparece, mesmo o que parece uma inserção digital, é real. Os tons, texturas e inclusive os letterings existiam no evento e foram trazidos para o Instagram com muita gentileza.
Era o tempo de brigar com muitos monstros que eu não queria enfrentar. Um pouco de confissão: os profissionais da área da decoração, uma vez juntos, emanam uma energia muito ruim de competição. Trabalhar debaixo dessa atmosfera cansa o triplo e é altamente desmotivador, porque por mais que não te digam nada, é possível sentir os olhares das pessoas que desejam que meu braço quebre enquanto estou desenhando. Evitei fazer lettering até o fim, por não achar minha caligrafia muito comercial e, naquele momento, estar cercado de gente muito egoísta que fazia isso muito bem (as primeiras escritas nas montagens não eram minhas, e só comecei a escrever muito tempo depois).
Mas, nem tudo é um filme de terror, e eu estou acostumado às zonas de perigo. A cooperação e amizade existem, e a Ju é uma dessas pessoas que tem muitos amigos no meio, por causa da energia de acolhimento que ela emana. Essa gente bem louca fica responsável pelos momentos de risadas e abraços que acontecem dentro dos instagramáveis que produzimos.
Eu nunca cresci em ambientes confortáveis de trabalho, mas virei um especialista em vencer limitações. Seja de tempo, espaço, recursos humanos, apoio ou orçamento. O Expo Center Norte, em São Paulo, virou um ambiente muito familiar para mim, onde já passei madrugadas usando um capacete e desenhando até começar a pestanejar. Eu me lembro de uma dessas ocasiões, onde a chuva tinha parado a cidade na manhã mais cedo. Tudo havia sido cancelado e a tempestade causou um colapso que eu nunca tinha visto em toda a capital paulista.
Para variar, eu vinha de um dia nada fácil, e estava muito cansado para produzir uma noite toda. Mas, não tinha solução; eu precisava ser adulto e encarar a demanda do meu próprio trabalho. Peguei um carro até o centro de exposições, me perguntando se tudo o que estava vivendo valia a pena, e esses questionamentos me trazem até essa página que escrevo hoje. Enxugando as lágrimas com a manga do casaco, desenhei uma noite completa, quase até amanhecer. Meu desespero incluía o fato de que precisaria voltar ao trabalho no dia seguinte, cedo. Situações assim são sufocantes e, geralmente, eu não tenho ouvidos disponíveis quando passo por elas.
Quando me levantei, tinha terminado um grande desenho. Algo que eu não teria coragem de fazer. Juliana me obrigou a fazer algo que nunca tinha feito até ali: ela me pediu que assinasse aquela sala. Esse foi apenas um dos muitos trabalhos que já fizemos juntos, e eu acredito que precisaria escrever apenas sobre isso, para que então coubesse tudo. Mas, aquela noite específica era o começo de muita coisa que eu nem fazia ideia do que realmente seria. Como Alice desenvolveu sua maturidade correndo pelo país das maravilhas em busca de encontrar sua própria coragem interior, ali começava uma jornada pelo desconhecido que me revelaria o fato de que crescer não era opcional. Crescer era necessário.