Antes que você me torça o nariz, eu ainda acredito que verde é a cor da esperança. Esse significado é antigo na parte do ocidente em que vivemos. Enquanto isso, em muitas regiões da Ásia, a esperança está associada ao amarelo. Isso já nos leva a pensar que esse conceito, “a cor de tal sentimento” é relativo de acordo com um contexto. Para a cor do ano 2022, a Pantone autoridade mundial na catalogação e pesquisa das cores também tem um contexto especial. E você tem tudo a ver com ele.

Caiu de paraquedas nessa conversa sobre Cor do Ano? Não se desespere: no ano passado eu escrevi um artigo rápido e bem completo sobre o Pantone Color Institute e a importância de se ter uma cor dando norte à narrativa do design gráfico, webdesign, design de interiores, decoração e moda. Vale retomar só um fio da meada aqui: a cor de cada ano conta uma história, não de como terminamos um ano, mas sobre o sentimento que queremos começar o ano novo. Por esse motivo, a cor do ano é proclamada em dezembro, e não em janeiro.

Um passo atrás

Um lembrete importante sobre a escolha da cor de um ano é o seu uso em materiais de destaque no ano anterior! Eu poderia gastar umas linhas dando exemplos da proeminência da cor de cada ano nas produções de grande alcance de seus anos antecessores, mas te deixo com as referências da própria cor de 2022 antes de seu anúncio. Essa relevância é um fator determinante para a escolha final.

Um cenário do desconhecido

Sempre que a Pantone quer trazer a narrativa do “desconhecido” e “incerto”, os tons de roxo aparecem. O mesmo ocorre quando se quer falar de começos, onde os azuis predominam, nos lembrando os infinitos da natureza (céu e mar), que são azuis. Que palavras poderiam descrever melhor o contexto de 2022 do que “Incerto” e “Recomeço”?

2021 trazia consigo a dualidade de ser um ano brilhante como o sol ou duro como uma pedra. Em minha opinião pessoal, o ano passado foi a exata mescla das duas sensações! Minha vida enfrentou momentos muito duros, ao passo que também tive aprendizados e crescimentos profissionais que me tornaram alguém muito mais iluminado do que fui em 2020. É claro que entre esses dois sentimentos, um deles fica mais forte, e você deve concordar comigo. A luz do sol em 2021 não nos fez colher o que estávamos esperando desde 2019, mas causou um pequeno milagre: nasceu uma plantinha no meio do concreto.

Very Peri

Essa plantinha tem nome! Periwinkle, em inglês. Uma florzinha muito conhecida em todo o Brasil, onde recebe diversos nomes: Pervinca, Vinca, Boa-Noite, Murta… Essa pequena e frágil flor, que pode nascer e crescer sob diversas (e bem adversas) circunstâncias, é o ponto de partida para a história que se quer contar em 2022.



Me vem uma cena forte da minha infância aqui: lembro que as murtas que cresciam no jardim dos meus vizinhos coloriam o chão com suas pétalas depois de uma rápida chuva. Em minhas caminhadas diárias, no janeiro chuvoso de São Paulo, vejo pétalas de pervincas pelo chão sempre depois das famosas chuvas de verão. Aquela flor, definitivamente, não é resistente. Mas, sua fragilidade não tira seu status de flor. E o que é uma flor, poetizando seu conceito biológico? Um sinal de que a planta está saudável e pronta para seguir vivendo, reproduzindo-se em outras novas plantas.

E assim
Seja lá como for
Vai ter fim a infinita aflição
E o mundo vai ver uma flor
Brotar do impossível chão

(Trecho de "Sonho Impossível". Mitch Leigh / Joseph Darion. Versão: Chico Buarque)

Laurice Pressman, vice-presidente do Pantone Color Institute destaca: “A Cor do Ano Pantone reflete o que está acontecendo em nossa cultura global, expressando o que as pessoas estão procurando através daquela cor e o que podem esperar em resposta às suas expectativas. Ao voltarmos à superfície depois de um intenso período de isolamento, nossas noções e padrões estão em transformação“.

Vale muito citar que Very Peri é uma cor que foi criada para ser a Cor do Ano 2022, de acordo com uma série de tendências que já demonstrei anteriormente. Até aqui, todas as chefes de cromias do ano eram escolhidas dentro do catálogo que a Pantone já tinha. A partir de agora, ficou impossível prever qual será a próxima cor, o que nos ilustra o cenário de imprevisibilidade que o mundo inteiro vive agora, colocando a fala de Pressman em ação: tudo está mudando.

Esse tom que não é azul e nem roxo me deixou frustrado no dia do lançamento. Lilás me lembra uma festa infantil de uma menina de dois anos de idade. Sabe? Aquela festa que não é tão hype como a primeira? O famoso “bolinho” para as pessoas próximas? Me lembro que minha chefe comentou: “eu gostaria muito de não me lembrar de trabalhar fora do ambiente de trabalho. Agora preciso conviver com o fato de que a Cor do Ano é a interface do Microsoft Teams”.

Aos poucos, fui entendendo a mensagem. Em essência, a coloração é quase neutra. É como se você “quase” quisesse ficar em silêncio mas (ao mesmo tempo) quisesse dizer ao mundo: mesmo frágil, com minhas flores ao chão, depois da tempestade, eu ainda estou aqui.

Não temos muitas certezas quanto ao cenário da vida a partir de agora. A pandemia terá mesmo um final? Vamos retomar o trabalho nos escritórios totalmente? Vamos ficar em casa para sempre? Um dia, nosso cotidiano voltará a ser como era antes de 2020? Enquanto tentamos sobreviver e recriar um estilo de vida, dizemos “sim” para que as nossas histórias sigam resistindo e florescendo. Nos permitimos ter esperança.